quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Poder Constituinte

1. Conceito
Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino: O poder constituinte é aquele exercido pelos legisladores constituintes. Ou seja, é o poder de elaborar e modificar normas constitucionais. É assim o poder de estabelecer a Constituição de um Estado, ou de modificar a Constituição existente.
Pedro Lenza: O poder constituinte pode ser conceituado como o poder de elaborar (neste caso originário) ou atualizar uma constituição, mediante supressão, modificação ou acréscimo de normas constitucionais (neste caso derivado do poder originário).
Alexandre de Moraes: O poder constituinte é a manifestação soberana da suprema vontade política de um povo, social e juridicamente organizado.
Teoria do Poder Constituinte
A teoria do poder constituinte está relacionada com a legitimidade do poder, com a soberania nacional e a soberania popular em um Estado.
- Revolução Francesa (Emmanuel Sieyès), o poder constituinte se opõe ao poder absoluto das monarquias de direito divino;
- Estados que adotam Constituição escrita e rígida;
- Princípio da supremacia constitucional;
- Poder constituinte é o poder que cria a Constituição;
- Poderes constituídos são o resultado dessa criação, isto é os poderes estabelecidos pela Constituição.
2. Titularidade e Exercício
O povo é o titular da soberania e do poder constituinte originário, determinando:
Quando deve ser elaborada ou modificada a nova Constituição;
Como deve ser ou modificar a Constituição.
A vontade constituinte é a vontade do povo, expressa por meio de seus representantes.
O povo é o titular do poder constituinte, porém o exercente é aquele que, em nome do povo, cria o Estado, editando a nova Constituição.
Participação do povo no exercício do poder constituinte democrático:
a) democracia participativa: é a participação direta do povo no processo de elaboração ou de aprovação da Constituição, por meio de plebiscito ou referendo, ou mediante apresentação, ao órgão constituinte, de propostas populares de dispositivos constitucionais para serem apreciadas e, se aprovadas (com ou sem modificações), incorporadas ao texto da Constituição (espécie de iniciativa popular constitucional).
b) democracia representativa: onde o povo escolhe seus representantes que formaram o órgão constituinte, incumbido de elaborar a constituição.
Historicamente
É mais freqüente a democracia participativa traduzir-se na sujeição do texto constitucional à aprovação do povo. A Constituição é elaborada e pela assembléia constituinte ou convenção e, ulteriormente, submetida a aprovação ou rejeição pelo povo, em sufrágio – referendo popular.
Brasil
Nem sempre o poder constituinte se exercitou segundo o princípio da legitimidade democrática. Nenhuma das nossas Constituições teve seu texto aprovado por referendo popular, havendo uma promulgação direta pela assembléia constituinte (Constituição de 1937, autoritária, outorgada previa um plebiscito que nunca houve).
Como exercício do poder legítimo democrático do poder constituinte temos as Constituições:
1891, 1934, 1946 e a de 1988 (atual);
Foram outorgadas, resultando da usurpação do poder constituinte as Cartas:
1824, 1937, 1967 e 1969.
Independente de forma de exercício do poder constituinte:
- Sempre que houver ruptura da ordem constitucional estabelecida, e sua substituição por uma outra, ocorre a manifestação do poder constituinte. A novo constituição será sempre obra do poder constituinte originário, mesmo que imposta mediante exercício ilegítimo do poder.
- O fato de ser o povo titular do poder constituinte, não implicará na sua manifestação e sim a existência de um novo ordenamento constitucional.
3. Espécies
3.1. Poder Constituinte Originário (genuíno, primário, inicial ou de primeiro grau)
Aquele que faz a Constituição e não se prende a limites formais, contendo as seguintes características:
a) Político (extrajurídico ou pré-jurídico): faz nascer a ordem jurídica, isto é, a ordem jurídica começa com ele e não antes dele. É o poder que:
- Estado novo cria uma constituição
- Estado já existente substitui uma constituição.
b) Inicial: sua obra é a base da ordem jurídica , pois cria um novo Estado, rompendo completamente com a ordem anterior.
c) Ilimitado e Autônomo: não tem que respeitar limites postos pelo direto anterior, isto é, o ordenamento jurídico anterior não limita a sua atividade de criar uma nova Constituição.
Ex. o poder constituinte originário da Assembléia Constituinte em 1988, para elaborar a nova Constituição Federal, não estava limitado pela ordem jurídica anterior (Constituição de 1969).
Esse caráter ilimitado do poder constituinte originário faz com que juridicamente não seja possível ao judiciário fiscalizar a validade das normas inseridas na Constituição, no momento de sua elaboração por esse poder.
Nesse sentido a jurisprudência do STF é mansa em admitir que o poder constituinte não se encontra sujeito a quaisquer limites impostos pela ordem jurídica interna, tampouco limitações de ordem suprapositiva.
d) Incondicionado: não está sujeito a qualquer forma prefixada para manifestar sua vontade, isto é, não está obrigado a seguir qualquer procedimento predeterminado para realizar sua obra.
e) Permanente: não se esgota no momento do seu exercício, isto é na elaboração da Constituição. Ele subsiste fora da Constituição e está apto para manifestar-se novamente a qualquer momento (movimento revolucionário), quando convocado pelo povo.
3.1.2 Exercício do Poder Constituinte Originário
O poder constituinte originário pode manifestar-se:
- na criação de um novo Estado (desintegração da extinta URSS).
- na refundição de um Estado (substituição de uma Constituição por outra, golpe, revolução, vontade social, etc.).
Forma de exercício:
a) autocrática (poder constituinte usurpado);
b) democrática (poder constituinte legítimo);
a) autocrática (poder constituinte usurpado)
Caracteriza-se pela denominada outorga. Ou seja, o estabelecimento da Constituição pelo indivíduo, ou grupo líder do movimento revolucionário que o alçou o poder, sem a participação popular. Trata-se de ato unilateral do governante que auto limita o seu poder e impõe as normas constitucionais ao povo.
A outorga constitui a criação autocrática da Constituição, um exercício do poder constituinte pela única vontade do detentor do poder, sem a participação dos governados, do povo, destinatários do poder (poder constituinte usurpado: Jorge Miranda e Paulo Bonavides).
b) Democrática (poder constituinte legítimo)
O exercício do poder constituinte democrático ocorre pela assembléia nacional constituinte ou convenção.
O povo escolhe seus representantes (democracia representativa), que formam o órgão constituinte, incumbido de elaborar a constituição do tipo promulgada.
Desde as origens do constitucionalismo a forma democrática de exercício do poder constituinte é utilizada.
Assim, o povo, legítimo titular do poder constituinte, democraticamente confere poderes a seus representantes especialmente eleitos para a elaboração e promulgação da Constituição.
3.1.3 Possíveis restrições ao poder constituinte originário segundo a doutrina
Direito Internacional
O poder constituinte originário deve ser visto como ilimitado apenas no âmbito interno do ordenamento jurídico, uma vez que no plano externo, não estaria legitimado a violar regras de convivência mínima com outros Estados, conforme o Direito Internacional. Daí, o Direito Internacional funcionar como uma espécie de limitação ao poder constituinte originário. Ex. Juridicamente inaceitável uma nova Constituição contraria as regras internacionais de direitos humanos.
Direito natural
O poder constituinte originário não poderia desrespeitar o direito natural, devendo respeitar os seus limites, valores éticos superiores.
Desaparecimento do Estado
O poder constituinte originário não poderia estabelecer uma nova constituição com normas que implique no desaparecimento do Estado, a abdicação à sua soberania ou à sua identidade (Ex. dispositivo constitucional que previsse a anexação do Estado por outro).
Todas as posições de limites ao poder constituinte originário são colocações da doutrina. No Brasil predomina a doutrina positiva e da autonomia desse poder.
3.2. Poder Constituinte Derivado (instituído, constituído ou de segundo grau)
Aquele exercido pelo órgão constitucional. Está previsto e regulado no texto da própria constituição e acompanhado das seguintes características:
a) Derivado: criado pelo poder constituinte originário;
b) Jurídico: por está previsto pela própria constituição;
c) Subordinado: encontra limitações constitucionais expressas e implícitas, não podendo desrespeitá-la sob pena de inconstitucionalidade;
d) Condicionado: sua atuação deve observar fielmente as regras predeterminadas pelo texto constitucional.

3.2.1. Poder Constituinte Derivado Reformador (de reforma, de emenda)
É o poder de modificar a CF/88, desde que respeitada as regras e limitações impostas pelo poder constituinte originário. Fundamenta-se na idéia de que o povo sempre tem o direito de rever e reformar a Constituição. Na CF/88, o exercício do poder constituinte derivado está atribuído ao Congresso Nacional, respeitando os limites estabelecidos.
Poder constituinte derivado revisor: a CF/88 estabeleceu dois procedimentos para modificação do texto constitucional;
Reforma: Art. 60;
Revisão: Art. 3º da ADCT.
3.2.2. Poder Constituinte Derivado Decorrente
É o poder que a CF/88 atribuiu aos estados-membros para se auto organizarem, por meio de elaboração de suas próprias constituições. É a competência atribuída pelo poder constituinte originário aos estados-membros para criarem suas próprias constituições, observando os limites anteriormente impostos.
3.3. Limites ao Poder Constituinte Derivado
a) Temporais: quando a Constituição estabelece um período durante o qual o seu texto não poder ser modificado;
b) Circunstanciais: quando a Constituição veda a sua modificação durante certas circunstancias excepcionais, de conturbação da vida do Estado;
c) Materiais: quando a Constituição enumera certas matérias que não poderão ser abolidas no seu texto pelo reformador (Ex. CF/88, Art. 60, § 4º)
d) Processuais ou formais: quando a Constituição estabelece certas exigências no processo legislativo de aprovação de sua modificação, tornando este distinto e mais laborioso do que aquele estabelecido para elaboração das demais leis do ordenamento.

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