quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Introdução a Ciência do Direito 2 - Teoria Dogmática da Decisão


TEORIA DOGMÁTICA DA DECISÃO

DECISÃO → é algo que se liga aos Processos deliberativos e aparece como termo correlato de conflito.

CONFLITO → pode ser entendido como o conjunto de alternativas que surgem da diversidade de interesses. Conflito, portanto, exige decisão, uma resposta na qual uma alternativa é escolhida, abandonando-se as demais.

A decisão ou resposta necessita de JUSTIFICAÇÃO como fundamento de sua LEGITIMIDADE, motivo pelos quais os PROCEDIMENTOS para a tomada da decisão são INSTITUCIONALIZADOS mediante normas.

→ A institucionalização do conflito e do procedimento decisório confere aos conflitos jurídicos uma qualidade especial: ELES TERMINAM.

→ A decisão jurídica é aquela capaz de por um fim aos conflitos, não no sentido de que os elimina, mas que impede a sua continuação.

→ De acordo com esse quadro teórico, a doutrina dogmática revela-se como uma investigação prática das regras de configuração e decisão dos conflitos.

→ O fenômeno jurídico é captado, nesse modelo, como um sistema de controle de comportamento. CONTROLE é, portanto, poder de decisão de conflitos institucionalizados.

Em conformidade com esse horizonte teórico, Ferraz Jr. Entende que o problema dogmático do controle na correlação entre conflito e decisão envolve dois aspectos distintos:

a) aspecto interno: enxerga a decisão jurídica como um controle a partir dos próprios instrumentos que o sistema normativo oferece (controle-disciplina); TEORIA DA APLICAÇÃO
b) aspecto externo: refere-se a instrumentos que a retórica jurídica traz para o sistema (controle-dominação).TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO

TEORIA DA APLICAÇÃO DO DIREITO

Na perspectiva dessa teoria, a decisão jurídica é vista como um problema de construção do juízo deliberativo pela pessoa que decide. A análise formal desse juízo aponta, inicialmente, para uma construção silogística, ou seja, sendo a decisão jurídica correlata de um conflito que a desencadeia e de uma norma que a institucionaliza, a primeira imagem que aparece é a de uma operação dedutiva em que:

a) a norma geral abstrata funciona como premissa maior;
b) a descrição do conflito (caso concreto) como premissa menor;
c) o ato decisório como conclusão.

→ Entretanto, reduzir o processo decisório a uma construção silogística o empobrece e não o revela na sua maior complexidade.

Na aplicação do direito, o juiz, além de demonstrar, por via hermenêutica, o sentido e alcance das normas, precisa também demonstrar que o caso a ser decidido nelas se enquadra. O processo de subsunção, portanto, não se reduz ao esquema lógico da dedução, exige maiores
esforços já na elaboração da premissa maior.

→ É preciso identificar no caso concreto as hipóteses de incidência que nas palavras da lei aparecem expressas por conceitos indeterminados e valorativos.

A decisão, entretanto, não fica submetida totalmente ao arbítrio de quem decide, existe um  certo controle na medida em que ela emerge do próprio sistema normativo.

O CONTROLE DA DECISÃO se exerce principalmente por intermédio de PROCEDIMENTOS INSTITUCIONALIZADOS que neutralizam a pressão dos fenômenos sociais sobre o sistema normativo.

Os aspectos burocráticos e a linguagem técnica protocolar se encarregam de manter a distância entre o procedimento e a relação social, de modo que a decisão possa ser dada apenas com fundamento nas regras do ordenamento jurídico.

Decisões podem ser programadas procedimentalmente de duas maneiras:

a) PROGRAMAÇÃO CONDICIONAL - fixando-se previamente os meios a serem utilizados, deixando-se em aberto as conseqüências a serem atingidas; ou
b) PROGRAMAÇÃO FINALÍSTICA - fixando-se as conseqüências a serem atingidas, deixando-se em aberto os meios a serem utilizados.

- Na programação condicional, a responsabilidade da pessoa que decide consiste no correto uso e aproveitamento dos meios (regras do ordenamento) sem se preocupar com a conseqüência atingida.

- Na programação finalística, a responsabilidade da pessoa que decide consiste em atingir uma certa conseqüência, por isso suporta toda a carga de uma correta busca dos meios, havendo entre meios e fins uma solidariedade inevitável.

Nos sistemas jurídicos burocratizados (tecnocráticos), há um forte predomínio de programações condicionais, posto que o sistema normativo aparece, primordialmente, como um conjunto de normas que estabelecem os procedimentos dentro dos quais as decisões são reconhecidas como obrigatórias e vinculantes. Insiste no respeito às regras técnicas estabelecidas na legislação mesmo que isso ocorra em prejuízo das condicionantes de fato, enquanto na justiça comunitária prevalecem os argumentos teleológicos e valorativos, tendo em vista a justiça do caso concreto, mesmo que isto ocorra em detrimento de certas condições legais.


TEORIA DA ARGUMENTAÇÃO

A teoria da argumentação jurídica visa esclarecer o controle da decisão a partir dos aspectos externos que emergem do meio circundante e repercutem no sistema.

De acordo com essa teoria, a DECISÃO JURÍDICA é um DISCURSO RACIONAL e por isso exige FUNDAMENTAÇÃO.

No curso do procedimento decisório sempre ocorre uma trama que exige das partes argumentações fundamentadas. A argumentação jurídica é, portanto, imprescindível para a obtenção das decisões.

A teoria da argumentação tem por objeto os raciocínios persuasivos, como são os jurídicos.

Viehweg entende a argumentação jurídica como uma forma típica de raciocínio, ou seja, raciocinar juridicamente é uma forma de argumentar.

A teoria da aplicação do direito mostra um quadro em que a decisão aparece como um sistema de procedimentos regulados, com predomínio das programações condicionais.

O discurso dogmático sobre a decisão não é, entretanto, apenas um discurso informativo sobre como a decisão deve ocorrer, mas também um discurso persuasivo sobre como se faz para que a decisão seja acreditada pelos destinatários.

→ Argumentar, portanto, significa tecer argumentos, aduzir os raciocínios que constituem uma argumentação, no sentido jurídico, é um modo específico de raciocinar que procede por questionamentos sucessivos.

Procedimento argumentativo dogmático:

  • Primeira etapa: Translatio → finalidade e de verificar se há mesmo um conflito e se ele é jurídico.
  • Segunda etapa: Conjectural → refere-se à consistência fática das alegações. (questionamentos: Há o fato? Quem é o autor? Houve ânimo do autor?).
  • Terceira etapa: Definitio → busca da relação entre o fato e seu sentido tipificado pela norma. Corresponde na argumentação jurídica, a uma “normativização” jurídica da semântica “natural”. Aqui entra a habilidade hermenêutica. Ex: enquadrar o caso concreto em “roubo” ou “furto”.

Isto eleva a importância do aspecto finalístico que visa despertar uma atitude de crença e motivar condutas. Entende-se, nesse sentido, a abundância na argumentação jurídica de argumentos (ab absurdo, ab auctoritate, contrario sensu, ad hominem, ad rem, entitema, etc) que pertencem ao patrimônio da retórica desde a Antiguidade.

  • ARGUMENTO AB ABSURDOsentido falso, inaceitável para o senso comum.
  • ARGUMENTO AB AUCTORITATE - opinião dos jurisconsultos, cientistas sociais, estudiosos e doutrinadores.
·         ARGUMENTO A CONTRARIO SENSU (de oposição) – consiste em concluir de uma proposição admissível, pela proposição que lhe é oposta. Essa estratégia permite antecipar as possíveis manobras discursivas que formarão a argumentação da outra parte durante a busca de solução jurisdicional para o conflito, enfraquecendo, assim, os fundamentos mais fortes da parte oposta.
  • ARGUMENTO AD HOMINEM corresponde a um argumento que limita a validade de uma tese ao que cada qual está disposto a conceder, aos valores que se reconhecem, aos fatos com os quais está de acordo. EX: Admite-se que a lei seja inconstitucional, mas aceitando que não fosse, mesmo assim não se pode concluir, como o deseja a parte contrária, que determinado ato seja ilegal.
  • ARGUMENTO A FORTIORI passagem de uma proposição para uma segunda, para a qual devem valer as mesmas razões da primeira, e ainda com mais força. Ex: quem pode o mais, pode o menos (valor axiológico).
  • ARGUMENTO A MAIORI AD MINUSna argumentação jurídica, passa-se da validade de uma disposição mais extensa, para a validade de outra menos extensa. Ex: desapropriação legal e ilegal por parte da autoridade e dever de indenização.
  • ARGUMENTO AD REMdiz respeito à verdade aceita pressupostamente por todos, pelo auditório universal.
  • ARGUMENTO SILOGÍSTICO OU ENTITEMA – confere credibilidade ao argumento, respeito ao rigor lógico (ou quase lógico) nos procedimentos de argumentação.

A utilização dos recursos retóricos revela que a dogmática da decisão se preocupa não propriamente com a verdade, mas com a verossimilhança. Não exclui a verdade de suas preocupações, mas ressalta como fundamental a versão da verdade.

Por essas razões, Ferraz Jr. entende que a dogmática da decisão constrói um sistema conceptual que capta a decisão como um exercício controlado do poder, como se as relações sociais de poder estivessem domesticadas.

Sublima-se a força e, com isso, diminui-se a carga emocional da presença da violência no direito.

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